Por Marjorie Riff

Em função da pandemia do novo coronavírus, o fechamento das escolas em Belo Horizonte e ao redor do Brasil já se arrasta por meses. Na capital mineira, o afastamento dos alunos e funcionários se deu em meados de março, e o prefeito Alexandre Kalil ainda não tem uma previsão de quando as aulas irão retornar na rede municipal. Nas escolas particulares, contudo, um possível retorno está sendo cogitado e planejado junto de alguns sindicatos de professores, e o discurso vigente é de que “estarão alinhadas com órgãos de saúde” nesta tarefa.

O fato é que, em casa, pais e filhos estão passando cada vez mais tempo juntos e essa aproximação sempre pode ser coordenada e facilitada com criatividade. Ademais, o aprendizado também pode surgir de ações e momentos simples, como fazer a leitura de um livro de ficção juntos.

Cheios de responsabilidades, os adultos costumam “perder” a capacidade de praticar hábitos como estes e as crianças, hoje em dia, estão cercadas por aparatos tecnológicos e “deixando de lado” o bom e velho livro.

DISTANTE DOS LIVROS

Segundo uma pesquisa da FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), realizada em 2018 em parceria com a CBL (Câmara Brasileira do Livro) e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros, o setor de venda de livros está em queda nos últimos anos no Brasil.

Pouco antes da pandemia da Covid-19, por exemplo, a Livraria Saraiva fechou as portas de suas lojas físicas em Belo Horizonte e migrou para o setor de vendas apenas online. Menos voltada para materiais escolares e mercadorias relacionadas à videogames e varejo, como sua maior concorrente Leitura, a Saraiva foi apenas uma de muitas livrarias fechadas, nos últimos anos no país.

Os hábitos de leitura mudaram para adultos, adolescentes e também para as crianças. O intenso fluxo de informações na internet e nas redes sociais, além da chamada “Cultura do Hipertexto” – cujos textos online estão mais objetivos para competirem com muitos outros -, alteraram bastante o modo como a leitura é encarada no dia a dia das pessoas atualmente. Porém, em tempos de pandemia, é preciso estimular a aprendizagem dos filhos em casa e estabelecer um ambiente mais tranquilo. E nada mais adequado para isso do que compartilhar leituras.

A CAPACIDADE DE OUVIR

Para a jornalista Maíra Mendes e Silva, moradora da Região Oeste de Belo Horizonte, que desde o início da paralisação das aulas de sua filha tem ficado com a pequena em casa, a leitura tem ajudado muito a aproximá-las e manter o interesse de Ana Júlia, de 6 anos, ativo e longe do celular, do tablet e dos vídeos animados na plataforma Youtube.

“Percebi que os livrinhos a deixam mais interessada se eu estiver lendo para ela e dando um pouquinho do meu tempo, coisa que eu raramente fazia antes da pandemia, pois trabalho muito”, conta.

Maíra ressalta que a estratégia de separar um instante de seu dia para ler para Ana Júlia melhorou sua capacidade de ouvir e identificar com mais atenção como a filha se expressa. “Ela sente muita falta da escola, dos amiguinhos, e cita cada um deles quando pergunto. Acho que as crianças também estão muito estressadas com essa nova realidade”, ressalta.

Sobre estar com a filha 100% do tempo, a jornalista se diverte. “Crianças podem enlouquecer os pais, já que nós não temos mais esse pique todo. Mas também é muito divertido, a gente aprende a dar valor às pequenas coisas que acontecem no dia. Tudo para eles é motivo de entusiasmo, de alegria em contar o que fez e de interagir. Acho que os adultos perdem um pouco dessa vontade de se divertir quando crescem”, narra Maíra.

Ler e ouvir são atos que estão diretamente conectados e são primordiais para o aprendizado em toda a vida. Entretanto, para as crianças, sentir que estão sendo ouvidas pelos pais costuma ser sinônimo de atenção dada e recebida.

E pensando nesse fantástico mundo infantil, o escritor, tradutor, jornalista e professor do UniBH, Leo Cunha, respondeu à algumas perguntas sobre o tema.

Você acredita que o hábito de leitura entre pais e filhos pode aproximá-los?

Leo: Acredito que sim. A leitura para os filhos pequenos é um ato de carinho e atenção. Os pais estão fazendo uma atividade ao lado do filho, dedicando seu tempo a eles. Quando maiores, os pais podem ler com os filhos, por exemplo, revezando: cada um lê um capítulo, em voz alta.

Nestes tempos de pandemia, a leitura pode ser uma boa opção para distrair as crianças em casa. Você acredita que o podcast literário é uma boa ferramenta também?

Leo: Sim, são boas opções. Tenho me dedicado a criar poemas animados (versões em vídeo dos meus poemas e histórias), que posto no Facebook com a hashtag #AnimandoAQuarentena. Acho que são leituras bacanas, também.

Fora do âmbito acadêmico, a leitura pode estimular o aprendizado desde a infância?  Quais leituras você indicaria para crianças de 6 a 10 anos? Ou um podcast literário, caso acompanhe.

Leo: Nessa idade, defendo principalmente a leitura literária, para curtir, se divertir, se emocionar, se intrigar. Acho que as crianças já têm uma grande carga de “aprendizagens” a fazer. A literatura deve ser um ato de prazer. Para os pequenos, sugiro meus livros, claro, e os de autores que admiro, como Ruth Rocha, Eva Furnari, Rosa Amanda Strausz, Adriana Falcão, Rosana Rios, Flávia Cortes, Marta Lagarta, Roseana Murray, Alessandra Roscoe, Marilda Castanha, Aline Abreu, Ricardo Azevedo, Alexandre Rampazo, Lalau, Ilan Brenman, José Roberto Torero, Tino Freitas, Caio Riter, Luiz Antônio Aguiar, Alex Gomes, entre tantos outros.

Você acredita que os livros físicos podem se tornar obsoletos diante de tanta tecnologia hoje em dia?

Leo: Não acredito. Tenho até um Kindle (aplicativo para leituras online e mobile), mas o uso para livros mais longos e sem imagens. Para a literatura infantil, o objeto livro – com suas texturas, tamanhos, cores e formatos – é perfeito e insubstituível.